Após a pandemia e com o avanço da automação, inteligência artificial e digitalização, surgiram novas formas de trabalho e também desafios em relação aos direitos trabalhistas. Uma das principais mudanças é a crescente adoção de plataformas digitais para a prestação de serviço. Para a advogada, especialista em direito do trabalho e direito empresarial, Nivea Ferreira, é importante ressaltar, nesse contexto, o surgimento do trabalho remoto. Para a profissional, se foi necessário que as pessoas se preparassem para estarem minimamente conectadas ao digital, também se fez fundamental, diante das novas tecnologias, reorganizar o direito do trabalho, abrindo-se frentes novas, especializadas. “Diante dessa realidade, foi aprovada em outubro de 2022 a Lei nº 14.442, que regulamenta o trabalho remoto e ajusta a legislação para os direitos e deveres de ambos os lados, para que ambos sejam respeitados e garantidos”, explica ela. Algumas regras da CLT não se aplicam ao home office. Um exemplo disso é o artigo 62 inciso terceiro da CLT, como consequência os empregados não terão direito às horas extras, mas, de acordo com Nivea, a empresa precisa ter atenção ao determinar o volume de exigidos para não cometer excessos. “Para fazer o controle de horas dos trabalhadores em home office, o melhor é utilizar um sistema digital moderno que substitui os cartões de pontos mecânicos e manuais. Além de trazer uma série de benefícios para a empresa, o sistema de ponto digital é reconhecido pelo Ministério do Trabalho”, destaca. No que diz respeito aos benefícios do colaborador, a advogada explica que, em home office, o trabalhador segue a ter direito, por exemplo ao vale refeição, pois segue exercendo suas atividades e o benefício é pago considerando o dia trabalhado. É importante ressaltar, segundo ela, que as empresas que atuavam em regime de CLT e apenas mudaram suas operações para o trabalho a distância, a jornada de trabalho continua sendo a mesma. Logo, quem trabalha em home office continua tendo o mesmo direito à refeição e o mesmo horário de descanso. Seus benefícios, como vale-refeição, vale-transporte, continuam sendo pagos, exceto se em convenções coletivas houver o entendimento contrário. Mas, ainda assim, o entendimento majoritário é que, uma vez concedido os benefícios, a supressão deles pode levar a uma interpretação de que houve uma alteração no contrato de trabalho prejudicial ao empregado. “Então esse é outro cuidado que deve ser tomado pela empresa”, alerta Nivea. Tudo isso também se estende para o convênio médico, auxílio-creche, dentre outros convênios e benefícios que a empresa pode ter com seus colaboradores. Assim, todo o benefício que o empregado possuía presencialmente vai continuar valendo quando for trabalhar em home office. É fundamental que a empresa fique atenta, no caso do trabalho home office, à minimização de possíveis riscos ao acidente de trabalho e doenças ocupacionais de seus colaboradores. Por isso, é importante que a empresa exija que o local de trabalho cumpra algumas especificações. Em geral, as empresas podem até mesmo fornecer equipamentos como notebook, celular corporativo, cadeira, mesa de trabalho e eventualmente ajuda de custo com gastos de eletricidade, plano de celular ou internet. Muitas empresas têm adotado a prática do home office para diminuir as despesas de seus negócios. Porém, para a especialista, o home office se configura como trabalho realizado remotamente, não necessariamente em casa, podendo ser realizado em qualquer lugar e todo o custo desse trabalho não deve sobrecarregar o colaborador. Por isso, é muito importante fazer um contrato de trabalho onde conste controle de horário dentre diversas medidas, como a criação de cláusulas que definam a jornada de trabalho, utilização de aplicativo, software que restringem o uso e o acesso de computador, a ausência de solicitação de serviço após o término do horário de trabalho do empregado, o período de férias e demais descansos, entre outros pontos. No que diz respeito à contratação de prestação de serviços do MEI – Micro Empreendedor Individual entende-se que não pode haver subordinação entre este e a empresa, como carga horária pré-estabelecida, por exemplo. Segundo Nivea, o que vem acontecendo é a empresa se utilizar desse tipo de contratação para driblar as leis trabalhistas, o que deve ser observado com atenção pela justiça do trabalho. “O prestador de serviço, fora da CLT, deve ser cobrado pela entrega dos serviços, por metas e não por subordinação à empresa contratante”, conclui ela.